Instrumentos de Crédito: Similaridades e Contrastes entre Notas Promissórias, Debêntures e Notas Comerciais

Os instrumentos de crédito são fundamentais no mercado financeiro, desempenhando papéis estratégicos na captação de recursos para empresas e na diversificação de opções para investidores. No Brasil, as Notas Promissórias e, principalmente, as Debêntures já se destacam como instrumentos amplamente conhecidos e utilizados ao longo dos anos, enquanto as Notas Comerciais, desde que adquiriram regime jurídico próprio, seguem em crescimento e já desempenham função importante no mercado de capitais.
Este artigo analisa esses instrumentos com base em critérios como prazo de vencimento, emitentes, forma de emissão, governança, e destinação dos recursos, à luz da legislação brasileira.
Emitentes
Os três instrumentos compartilham um tipo de entidade emitente em comum: as sociedades anônimas, que podem emitir tanto Debêntures, quanto Notas Promissórias e Notas Comerciais. No entanto, é preciso destacar algumas diferenças com relação aos outros tipos de emitentes permitidos. Conforme art. 52, da Lei nº 6.404/76 (LSA), as Debêntures são um instrumento exclusivo das sociedades anônimas, sendo, portanto, instrumentos de captação de recursos bastante restritos.
Em contraste, as Notas Comerciais apresentam uma abrangência maior, sendo autorizada sua emissão, segundo o art. 46 da Lei nº 14.195/21, por sociedades anônimas, limitadas e cooperativas. Emitentes semelhantes têm as Notas Promissórias, por sua vez, também podendo ser emitidas pelos três tipos de sociedade (art. 2º, da Resolução CVM nº 163/22). Porém, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) limitou a emissão para distribuição pública no caso das cooperativas, exigindo que essas tenham por atividade a produção, comercialização, beneficiamento ou industrialização de produtos ou insumos agropecuários, ou de máquinas e implementos utilizados na atividade agropecuária (art. 2º, parágrafo único, da Resolução CVM nº 163/22).
Prazos de Vencimento
Os prazos de vencimento são uma das principais distinções entre os três instrumentos de captação de recursos. As Notas Promissórias, tradicionalmente, são títulos de curto prazo, com limite máximo de 360 dias, conforme dispõe o art. 5º, caput, da Resolução CVM nº 163/22. Nota-se, que há uma exceção a esse prazo de vencimento, que ocorre quando as notas forem destinadas exclusivamente a investidores profissionais e acompanhadas por agente fiduciário, deixando de ser aplicável o prazo de vencimento de 360 dias, conforme estabelece o § 1º do artigo mencionado.
As Notas Comerciais, por sua vez, apresentam uma flexibilidade maior, permitindo vencimentos que variam tanto entre curto quanto médio ou longo prazo, não havendo qualquer determinação na Lei 14.195/21 sobre um prazo máximo. Segundo dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), 39% das Notas Comerciais emitidas em ofertas públicas vencem de 3 a 5 anos, sendo majoritariamente utilizadas como instrumentos de médio prazo.1
Assim como as Notas Comerciais, as Debêntures também não possuem um prazo máximo de vencimento definido pela legislação. Essa flexibilidade permite que os emitentes adaptem o prazo ao objetivo da captação e às condições de mercado. Embora não possuam um prazo máximo legal, as Debêntures são frequentemente emitidas considerando um vencimento de médio a longo prazo. Segundo a Anbima, considerando as Debêntures emitidas de janeiro a julho de 2024, o prazo médio de vencimento foi de 8,1 anos, enquanto as Debêntures Incentivadas, por exemplo, registraram prazo médio de 12,7 anos.2
Competência para Deliberação de Emissão
A competência para a deliberação sobre a emissão de Notas Comerciais, Notas Promissórias e Debêntures por sociedades varia conforme as disposições legais específicas de cada instrumento envolvido. Em relação às Notas Comerciais, o art. 46, parágrafo único, da Lei 14.195/21 estabelece que a deliberação sobre emissão de Nota Comercial compete aos órgãos de administração (quando houver) ou ao administrador, podendo o ato constitutivo do emitente estabelecer diferente.
No que diz respeito às Debêntures, a competência para sua emissão é tratada no art. 59, caput, da LSA, que estabelece que a deliberação sobre a emissão desses instrumentos é de competência privativa da assembleia-geral de acionistas. Ainda, o § 1º, do mencionado artigo, autoriza o conselho de administração ou a diretoria a deliberar sobre a emissão de debêntures não conversíveis em ações, salvo disposição estatutária em contrário. Ademais, a legislação segue afirmando, no § 2º do mencionado artigo, que o estatuto social de companhias abertas poderá autorizar o conselho de administração a deliberar sobre a emissão de debêntures conversíveis em ações.
Quanto às Notas Promissórias, não há disposição específica que trate sobre a competência para deliberação de emissão particular desses instrumentos. No entanto, a CVM, por meio da Resolução CVM 163/22, dispôs que o estatuto social ou contrato social do emitente que deverá tratar sobre a competência para autorizar a emissão de notas promissórias, nos casos de ofertas públicas de distribuição (art. 6º).
Alteração das Condições
As exigências para a aprovação da alteração das condições de uma emissão de Debêntures são mais rigorosas quando comparada com os demais instrumentos. Segundo art. 71 da LSA, os titulares de debêntures de uma mesma emissão podem se reunir em assembleia com o intuito de deliberar sobre matérias de interesse da comunhão dos debenturistas, sendo necessário que metade das debêntures em circulação estejam de acordo com a modificação para que ela seja aprovada (cada debênture possui um voto), salvo se a escritura de emissão estabelecer quórum maior para a aprovação.
A Lei 14.195/21, no 2º e 3º de seu art. 47, também aborda a questão da alteração das condições no caso das Notas Comerciais, definindo, inclusive, que a convocação e o funcionamento da assembleia de titulares das Notas Comerciais seguirão o disposto sobre a assembleia geral de debenturistas. Ademais, para aprovar uma alteração, é necessário a maioria simples dos titulares de notas comerciais em circulação, se maior quórum não for estabelecido no termo de emissão.
Garantias e Agente Fiduciário
As Notas Promissórias, as Notas Comerciais e as Debêntures não possuem garantias obrigatórias por lei, ficando a critério do emitente decidir incluir ou não garantias nas condições desses instrumentos. Além disso, é importante destacar que nenhum desses instrumentos é coberto pelo Fundo Garantidor de Créditos (FGC), o que aumenta a relevância de fatores como a análise da solvência do emitente e, quando existentes, das garantias oferecidas. Assim, enquanto as garantias podem ser incluídas para aumentar a atratividade do instrumento para investidores, sua ausência não impede a emissão ou a negociação no mercado.
Quanto ao agente fiduciário, a obrigatoriedade de sua presença é legalmente estabelecida no § 1º, do art. 61 da LSA, nas emissões de Debêntures que serão negociadas no mercado, não havendo necessidade de sua intervenção nas emissões privadas. Nos casos das Notas Comerciais, não há obrigatoriedade na contratação de um agente fiduciário, mas o art. 50 da Lei nº 14.195/21 afirma que a CVM pode estabelecer a eventual contratação de um nas emissões de Notas Comerciais ofertadas publicamente ou admitidas à negociação em mercados regulamentados de valores mobiliários.
Sobre as Notas Promissórias, como já explicitado na discussão sobre o prazo de vencimento, o agente fiduciário somente é exigido nos casos de oferta pública de distribuição direcionada exclusivamente a investidores profissionais com prazo de vencimento superior a 360 dias.
Considerações Finais
Os instrumentos de crédito desempenham um papel estratégico no mercado financeiro brasileiro, com características que os tornam adequados para diferentes perfis de investidores e necessidades de empresas. Como já explicado, uma mesma sociedade, por exemplo, pode decidir emitir Notas Promissórias, Debêntures ou Notas Comerciais como forma de captação de recursos, sendo cada instrumento útil para diferentes estratégias de captação. Portanto, compreender as especificidades de cada um dos instrumentos é essencial para investidores e empresas que buscam alinhar suas estratégias financeiras à legislação vigente e às condições de mercado, otimizando sua estratégia de captação de recursos via mercado de capitais.