Como se diferenciam ofertas públicas e privadas no Mercado de Capitais Brasileiro

Nos últimos anos, o mercado de capitais brasileiro atravessou, , um período de ampla modernização normativa. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM), enquanto órgão regulador, editou verdadeiros marcos regulatórios, com o objetivo de consolidar regulamentações dispersas e promover uma maior transparência e segurança jurídica no setor.
Dentre essas iniciativas, destaca-se a Resolução CVM 160 (RCVM 160), que revogou as Instruções CVM 400/2003 (ICVM 400) e 476/2009 (ICVM 476), unificando normas relacionadas a ofertas públicas. No caso, a ICVM 400 tratava de ofertas públicas com registro ordinário, enquanto a ICVM 476 abordava ofertas públicas com esforços restritos, direcionadas a um público específico e com critérios simplificados de registro.
Outro exemplo de normativa recente que trata de ofertas públicas é a Resolução CVM 88 (RCVM 88), que regula a oferta pública de distribuição de valores mobiliários de emissão de sociedades empresárias de pequeno porte realizada por meio plataformas de investimento coletivo, o crowdfunding.
Em meio a tantas mudanças, torna-se oportuno reviver uma importante discussão sobre a distribuição de valores mobiliários: a diferença entre os ritos público e privado de oferta.
O Art. 3° da RCVM 160 define oferta pública como toda aquela em que há comunicação (do ofertante, emissor, instituições intermediárias ou de quaisquer outras pessoas que atuem em nome destes) para destinatários diversos, com o intuito de despertar interesse ou prospectar investidores para determinado valor mobiliário. As ofertas públicas, portanto, caracterizam-se pelo seu direcionamento a uma generalidade de investidores. Exemplos que denotam a publicidade de uma oferta são: (i) a utilização de material publicitário; (ii) a consulta de viabilidade da oferta ou coleta de intenções de investimento com potenciais investidores; e (iii) negociação dos valores mobiliários em estabelecimentos aberto ao público ou na rede mundial de computadores.
Neste contexto, ordinariamente, as ofertas públicas de valores mobiliários dependem de uma análise prévia pela CVM, a qual só concede o registro após a verificação do cumprimento dos requisitos estabelecidos pela RCVM 160. Ou seja, a fiscalização ocorre como uma etapa precedente a concessão do registro e distribuição dos valores mobiliários. Os ritos das ofertas públicas, no entanto, podem ser flexibilizados a depender de características específicas, existindo também a possibilidade de registro automático – quando o registro é concedido sem a análise prévia da autarquia –, ou até mesmo de dispensa de registro, conforme previsto na RCVM 88.
Por outro lado, as ofertas privadas, apesar de não possuírem um conceito formal definido em lei ou regulação, caracterizam-se por terem destinatários definidos e específicos, isto é, não estão abertas a um público geral e indefinido. Neste contexto, o Art. 8° da RCVM 160 traz uma série de hipóteses que configuram ofertas privadas, denominadas na norma como “Ofertas não Sujeitas a esta Regulamentação”, dentre as quais se destacam (i) as ofertas iniciais e subsequentes de cotas de fundos de investimento fechados exclusivos, e (ii) as ofertas de lote único e indivisível de valores mobiliários destinado a um único investidor.
Esta classificação como pública ou privada é importante para a distinção dos regimes jurídicos aplicáveis a cada tipo de oferta. As ofertas privadas, por se destinarem a investidores específicos, com um cenário de captação definido e riscos sistêmicos limitados, não se sujeitam às normas da CVM, estando, portanto, dispensadas do sistema de registros da autarquia. Por outro lado, as ofertas públicas permitem acesso a recursos da poupança popular, o que justifica regime de regulação e fiscalização exercido pela CVM, a qual visa, por meio do princípio do full disclosure e do sistema de registros, a redução da assimetria de informações entre ofertantes e investidores, de modo a conferir maior segurança e estabilidade ao mercado de capitais.
A distinção entre ofertas públicas e privadas define, portanto, o grau de supervisão e os requisitos regulatórios aplicáveis. Enquanto as ofertas públicas demandam maior transparência e supervisão pela CVM, as ofertas privadas, operam em um regime mais flexível, adequado ao seu menor impacto sistêmico.