O Papel do Estruturador e do Coordenador nas Ofertas Públicas de Valores Mobiliários 

José Matheus Muniz e Yasmin Peixoto Braga
José Matheus Muniz e Yasmin Peixoto Braga

INTRODUÇÃO 

Para que uma empresa realize uma emissão de valores mobiliários, é necessário o envolvimento de diversos participantes do mercado de capitais. Isso pois, as ofertas de valores mobiliários, além de representarem uma importante ferramenta de captação de recursos para empresas, constituem-se como operações complexas e de alta relevância, que exigem uma atuação coordenada de diversos agentes especializados. 

Dois desses agentes exercem papéis estratégicos e complementares: o estruturador e o coordenador da oferta. Eles são fundamentais para viabilizar essas operações e possuem funções distintas, além de atuarem em momentos diferentes das emissões. Este artigo busca esclarecer as diferenças entre essas duas figuras, apresentar suas atribuições específicas e destacar sua importância na realização das operações de emissão de valores mobiliários e no sucesso da oferta como um todo. 

CONCEITO E ATRIBUIÇÕES DO ESTRUTURADOR 

O estruturador é o agente responsável por idealizar e estruturar a operação que dará origem à emissão de valores mobiliários. Ele atua principalmente na fase de concepção das ofertas, sendo responsável por identificar as necessidades financeiras das empresas, avaliar sua viabilidade econômica e estruturar os fluxos financeiros do papel. 

Assim, constituem-se como empresas ou instituições que estruturam financeiramente as operações de captação de recursos no mercado, de modo a torná-las economicamente viáveis. O estruturador muitas vezes pode ser  um gestor de recursos (uma das categorias de administradores de carteiras de valores mobiliários),  um assessor de investimento, um assessor financeiro ou mesmo a pessoa contratada para ser coordenador da oferta (normalmente quando valores maiores são captados com auxílios de grandes bancos). 

Os estruturadores podem auxiliar na idealização de operações de securitização, como os certificados de recebíveis imobiliários (CRI) e certificados de recebíveis do agronegócio (CRA), notas comerciais, debêntures, além de estruturar fundos e outros valores mobiliários.  

Dentre suas principais atribuições, o estruturador: (i) identifica ativos com potencial de fluxo futuro confiável e mensurável; (ii) analisa o crédito e o seu risco, a qualidade dos devedores e a previsibilidade dos fluxos financeiros; (iii) auxilia na elaboração da documentação necessária para emissão, conduzida pelo assessor legal da oferta; e (iv) auxilia na busca por investidores para subscreverem os valores mobiliários.   

De forma simplificada, o estruturador muitas vezes idealiza o produto que será ofertado ao mercado. A atuação do estruturador não é apenas uma função técnica ou financeira, mas uma posição estratégica. Os agentes que exercem esse papel facilitam o acesso das empresas ao mercado de capitais, que continuamente se mostra como uma excelente alternativa para buscar financiamento. 

Ressalta-se que o estruturador atua como importante ponte entre os coordenadores da oferta e os devedores e/ou originadores da operação, articulando os interesses e necessidades de ambas as partes a fim de encontrar o fluxo financeiro que mais se adequa à realidade financeira dos tomadores de dívida e ao apetite do mercado de capitais. 

CONCEITO E ATRIBUIÇÕES DOS COORDENADORES DE OFERTAS 

Por sua vez, o coordenador atua na fase posterior à estruturação da operação. Trata-se de uma instituição financeira, geralmente um banco de investimento ou corretora, responsável por coordenar o processo de distribuição dos valores mobiliários. Em apertada síntese, o coordenador é a “instituição financeira com a função principal de organizar ofertas públicas de valores mobiliários 1, segundo a própria B3.  

Essas instituições financeiras atuam como intermediárias entre o investidor e as empresas que procuram financiamento no mercado de capitais, negócio jurídico chamado de underwriting2. De acordo com Nelson Eizirik, sua atuação se justifica uma vez que:  

“As companhias, em regra, não apresentam capacidade profissional nem experiência para apelar diretamente à poupança popular. Também não desejam assumir os riscos inerentes à venda ao público dos valores mobiliários que emitem. Por estas razões, contratam instituições financeiras especializadas para procederem distribuição pública de ações, debêntures ou outros valores mobiliários de sua emissão.”3 

A Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (ANBIMA), define os coordenadores, em seu Código de Ofertas Públicas, como “[…] instituições intermediárias signatárias do contrato de distribuição na qualidade de Coordenadores e registradas na CVM nos termos de regulação específica.”4 

Vale destacar que uma oferta pública de valores mobiliários pode possuir um ou mais coordenadores em consórcio de distribuição, sendo que um sempre deverá figurar como líder na condução da oferta pública5. De acordo com a regulação da CVM, eventuais comunicações da autarquia sobre a oferta serão endereçadas ao coordenador líder e ele é o principal responsável pelo estrito cumprimento das regulações de ofertas públicas. 

Dessa forma, diante de sua relevância para a distribuição dos ativos e para a oferta em geral, a presença deste agente, segundo a CVM, é obrigatória para as ofertas públicas de valores mobiliários reguladas pela Resolução CVM nº 160/2022. É, em conjunto com o coordenador líder, que a empresa ofertante do valor mobiliário deverá requerer o registro da oferta na CVM e na ANBIMA (quando houver adesão aos códigos da entidade autorreguladora).  

Isso pois, é papel do coordenador líder ser o principal interlocutor entre a empresa ofertante, CVM, ANBIMA, B3 e os investidores. Vale destacar que, além de outros coordenadores, o coordenador líder poderá convidar outras instituições financeiras para auxiliar na distribuição dos valores mobiliários (participantes especiais), formalizando o pool de participantes da oferta6 

Portanto, dentre as funções do coordenador líder está: (i) definir a estratégia de colocação da oferta; (ii) determinar o preço dos valores mobiliários em conjunto com o emissor; (iii) coordenar a elaboração dos documentos da oferta, inclusive do prospecto e da lâmina, nos casos em que estes documentos são necessários; (iv) providenciar os registros junto à CVM; (v) promover a divulgação da oferta ao mercado; e (vi) garantir o cumprimento das regras aplicáveis à oferta pública. 

Em suma, o coordenador líder é quem “coloca o produto na rua”, sendo responsável por viabilizar sua distribuição com sucesso e em conformidade com os requisitos legais estabelecidos pelas entidades do mercado de capitais. 

DIFERENÇAS ENTRE O ESTRUTURADOR E O COORDENADOR LÍDER E A IMPORTÂNCIA DE CADA AGENTE PARA O SUCESSO DA OFERTA 

Em resumo, embora ambos os agentes estejam envolvidos na oferta do valor mobiliário, estruturador e coordenador líder desempenham papéis distintos, com objetivos e responsabilidades próprios – mesmo que muitas vezes se tratem da mesma instituição prestando as duas funções.  

O estruturador é responsável por garantir a qualidade, segurança e atratividade do valor mobiliário estruturado, participando da fase embrionária da oferta, enquanto o coordenador líder assegura que esse produto chegue ao mercado de forma eficiente, transparente e em conformidade com a regulação, participando mais ativamente do desenvolvimento da oferta, distribuindo e colocando os papéis no mercado de capitais. 

Uma oferta realizada sem a estruturação adequada pode gerar riscos desproporcionais, problemas de inadimplência e/ou baixa atratividade para o investidor. Da mesma forma, uma distribuição conduzida de forma errônea pode comprometer a captação de recursos, mesmo que o ativo seja sólido. Por isso, ambos os papéis são fundamentais e devem atuar de forma alinhada desde o início do processo. 

CONCLUSÃO 

A compreensão clara das diferenças entre o estruturador e o coordenador líder é essencial para qualquer profissional ou investidor que atue no mercado de capitais. Embora atuem em momentos distintos da operação, ambos têm responsabilidades cruciais para garantir que uma oferta de valores mobiliários seja bem estruturada, bem distribuída e, sobretudo, bem-sucedida. No contexto de um mercado que caminha para soluções cada vez mais sofisticadas, a atuação coordenada desses agentes será ainda mais relevante.  

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS  

BRASIL. Coordenador Líder – o que é, significado e definição. B3 Bora Investir, Glossário. São Paulo, 2023. B3 – Brasil, Bolsa, Balcão. Disponível em: https://borainvestir.b3.com.br/glossario/coordenador-lider/. Acesso em: 11.06.2025.  

BRASIL. Resolução CVM 160, de 13 de julho de 2022. Comissão de Valores Mobiliários. Rio de Janeiro, 2022. Disponível em: https://conteudo.cvm.gov.br/legislacao/resolucoes/resol160.html. Acesso em 11.06.2025. 

BRASIL. Código de Ofertas Públicas. Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais. Rio de Janeiro, 2024. Disponível em: https://www.anbima.com.br/pt_br/autorregular/codigos/ofertas-publicas/ofertas-publicas.htm. Acesso em: 11.06.2025.  

BRASIL. Guia de Melhores Práticas de Mercado: Ofertas de Fundos de Investimento Imobiliário. São Paulo. B3 – Brasil, Bolsa, Balcão. Disponível em: https://www.b3.com.br/data/files/16/66/B4/78/BBA9A710C21797A7AC094EA8/Guia%20melhores%20praticas_Fundos_Jul21.pdf. Acesso em: 12.06.2025. 

BRASIL. Regras e Procedimentos de Ofertas Públicas. Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais. Rio de Janeiro, 2025. Disponível em: https://www.anbima.com.br/pt_br/autorregular/codigos/ofertas-publicas/ofertas-publicas.htm. Acesso em: 11.06.2025. 

EIZIRIK, Nelson (et. al). Mercado de Capitais: Regime Jurídico. 4. Ed. São Paulo: Quartier Latin, 2019.

Equipe relacionada

José Matheus Muniz

Yasmin Peixoto Braga

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