REPERCUSSÕES JURÍDICAS DA LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL DO BANCO MASTER 

João Vitor C. C. Ohara e Matheus Melo Eschipio
João Vitor C. C. Ohara e Matheus Melo Eschipio

INTRODUÇÃO 

No dia 18 de novembro de 2025, o Banco Central do Brasil decretou a liquidação extrajudicial do Banco Master S.A., bem como de outras instituições pertencentes ao mesmo conglomerado, incluindo o Banco Master de Investimento S.A., o Banco Letsbank S.A. e a Master S.A. Corretora de Câmbio, Títulos e Valores Mobiliários. Na mesma data, a Polícia Federal deflagrou a denominada Operação “Compliance Zero”, que culminou na prisão do controlador do grupo, o empresário Daniel Vorcaro. 

Diante da relevância econômica e jurídica do caso, o presente artigo tem por objetivo examinar o histórico do Banco Master, desde sua trajetória de expansão a partir da aquisição por Daniel Vorcaro até o agravamento da crise que motivou a intervenção estatal. Além disso, serão abordados os desdobramentos legais da decretação da liquidação extrajudicial pelo Banco Central, com especial atenção às implicações para o Sistema Financeiro Nacional (SFN) e para os investidores, inclusive quanto à atuação do Fundo Garantidor de Créditos (FGC). 

HISTÓRICO DO BANCO MASTER 

O Banco Master tem suas origens em 1974, com a criação da corretora Máxima, que viria a se transformar em instituição bancária na década de 1990. Somente em 2018 a empresa passou ao controle de Daniel Vorcaro, assumindo oficialmente a denominação Banco Master S.A. em 20211. 

Sob a gestão de Vorcaro, o banco experimentou um processo de expansão acelerada. Seu patrimônio líquido, que era de aproximadamente R$ 219 milhões, ultrapassou a marca de R$ 5 bilhões em apenas cinco anos. Tal crescimento se apoiou sobretudo em duas estratégias centrais: (i) a aquisição de empresas em situação financeira crítica, com a intenção de realizar operações de turnaround; e
(ii) a forte captação por meio de Certificados de Depósito Bancário (CDBs) com remuneração bastante superior à média de mercado2. 

A partir de 2022, entretanto, aumentaram as dúvidas do mercado sobre a sustentabilidade financeira da instituição. Enquanto bancos bem capitalizados remuneravam seus CDBs na faixa de 100% a 105% do CDI, o Banco Master ofertava títulos com juros que chegavam a 180% do CDI — um patamar que, embora atraente aos investidores, elevava drasticamente seu custo de captação3. 

O cenário se deteriorou ainda mais em março de 2025, quando foi anunciada a venda de 58% do capital do Banco Master ao Banco de Brasília (BRB) por cerca de R$ 2 bilhões. A operação enfrentou forte resistência do Ministério Público do Distrito Federal e do Ministério Público de Contas, resultando, posteriormente, na sua reprovação pelo Banco Central. Com isso, o aporte esperado não se concretizou4. 

Paralelamente, em maio de 2025, o Banco Master obteve do FGC uma linha de assistência financeira emergencial de R$ 4 bilhões, posteriormente renovada por duas vezes — medida que indicava já um quadro de tensão de liquidez5. 

Na véspera da decretação da liquidação extrajudicial (17/11), divulgou-se ainda uma proposta de aquisição da instituição pela holding Fictor em conjunto com um consórcio de investidores dos Emirados Árabes Unidos, prevendo um aporte imediato de R$ 3 bilhões. Apesar da sinalização positiva ao mercado, a proposta não chegou a ser concretizada antes da intervenção estatal6 

PROCESSO DE LIQUIDAÇÃO EXTRAJUDICIAL 

A liquidação extrajudicial do Banco Master S.A. foi decretada pelo Banco Central do Brasil em 18 de novembro de 2025, por meio do Ato do Presidente nº 1.369, com fundamento no comprometimento da situação econômico-financeira da instituição, especialmente em razão da deterioração da liquidez, de infrações às normas que regem a atividade bancária e do descumprimento reiterado de determinações da autoridade supervisora. Na mesma data, a medida foi estendida às demais entidades do conglomerado Master — Banco Master de Investimento S.A. (Ato do Presidente nº 1.371), Banco Letsbank S.A. (Ato do Presidente nº 1.372) e Master S.A. Corretora de Câmbio, Títulos e Valores Mobiliários (Ato do Presidente nº 1.373) — em razão do vínculo de interesse e direção comum, caracterizado pelo exercício unificado do poder de controle. 

Embora outras instituições financeiras já tenham sido submetidas ao regime de liquidação extrajudicial — como o Banco Nacional (1995), o Banco Bamerindus (1997), o Banco Santos (2004) e o Banco Cruzeiro do Sul (2012) — o caso do Banco Master representa, até o momento, a maior liquidação do Sistema Financeiro Nacional, abrangendo aproximadamente R$ 86,396 bilhões em ativos7. 

Fundamentos Legais da Liquidação Extrajudicial 

A liquidação extrajudicial é disciplinada pela Lei nº 6.024/1974, que autoriza a aplicação do regime ex officio pelo Banco Central quando verificados, entre outros, os seguintes cenários (art. 15): (i) comprometimento da situação econômica ou financeira da instituição, especialmente quando houver inadimplemento sistemático de obrigações ou caracterização de hipóteses que permitiriam a decretação de falência; (ii) violação grave de normas legais, regulamentares ou estatutárias, inclusive descumprimento de determinações do Conselho Monetário Nacional ou do Banco Central; (iii) prejuízo que coloque em risco anormal os credores quirografários; e (iv) cassação da autorização para funcionamento, sem início da liquidação ordinária no prazo legal de 90 dias ou com condução morosa que possa prejudicar os credores. 

Além da atuação de ofício, a liquidação também pode ser decretada por requerimento dos administradores (quando o estatuto lhes conferir tal atribuição) ou por proposta do interventor, mediante exposição dos motivos justificadores (art. 15). 

Papel do Liquidante e Efeitos Imediatos da Medida 

Uma vez instaurado o regime, o Banco Central deve nomear um liquidante com amplos poderes de administração e representação da massa (art. 16).  

No caso do Banco Master, foi nomeada a EFB Regimes Especiais de Empresas Ltda. entre cujas atribuições destacam-se: (i) verificação, habilitação e classificação dos créditos; (ii) movimentação de pessoal, com nomeações e demissões; (iii) constituição e cassação de mandatos; e (iv) propositura de ações judiciais e prática de atos necessários à preservação e liquidação do acervo patrimonial. 

A decretação da liquidação também acarreta os efeitos automáticos previstos no art. 18 da Lei nº 6.024/1974, entre os quais: (i) a suspensão das ações e execuções contra a instituição, vedada a propositura de novas demandas enquanto durar o regime; (ii) o vencimento antecipado de todas as obrigações da entidade liquidanda; (iii) a não aplicação de cláusulas penais relativas a contratos unilaterais vencidos por força da liquidação; (iv) a suspensão da fluência de juros contra a massa até o pagamento integral do passivo; (v) a interrupção da prescrição das obrigações da instituição; e (vi) a impossibilidade de incidência de correção monetária sobre divisas passivas e penalidades pecuniárias administrativas ou criminais. 

Habilitação de Créditos e Meios de Impugnação 

Durante o processo, o liquidante deve publicar aviso convocando os credores a declarar seus créditos (art. 22). Após a análise, caberá a ele decidir sobre legitimidade, valor e classificação, o que será formalizado em quadro geral de credores (art. 23). 

Os credores que discordarem das decisões do liquidante podem apresentar recurso ao Banco Central (art. 24). Caso o recurso seja negado, permanece aberta a possibilidade de prosseguimento das ações anteriormente suspensas, ou ajuizamento de novas ações pertinentes, mediante comunicação ao liquidante para reserva de valores suficientes à eventual satisfação dos pedidos (art. 27). 

Responsabilização dos Administradores  

A lei também prevê mecanismos de apuração de responsabilidade dos administradores e membros do conselho fiscal. Havendo indícios de crimes ou contravenções penais, o liquidante deve remeter os autos ao Ministério Público (art. 32). 

Os administradores também têm seus bens tornados indisponíveis até a apuração final das responsabilidades (art. 36), respondendo por atos ou omissões no exercício da gestão (art. 39), e são responsáveis solidários pelas obrigações assumidas durante seus mandatos (art. 40). No caso do Banco Master, tornaram-se indisponíveis os bens dos controladores (Master Holding Financeira S.A.; 133 Investimentos e Participações Ltda.; Armando Miguel Gallo Neto; Daniel Bueno Vorcaro; e Felipe Wallace Simonsen) e ex-administradores (Angelo Antonio Ribeiro da Silva; Daniel Bueno Vorcaro; Felipe Wallace Simonsen; e Luiz Antonio Bull). 

Encerramento da Liquidez 

Por fim, a liquidação extrajudicial encerra-se por decisão do Banco Central com (i) o pagamento integral dos credores quirografários, (ii) a mudança de objeto social da instituição para atividade econômica não integrante do Sistema Financeiro Nacional, (iii) a transferência do controle societário da instituição, (iv) convolação em liquidação ordinária, (v) exaustão do ativo da instituição, mediante a sua realização total e a distribuição do produto entre os credores, ainda que não ocorra o pagamento integral dos créditos; ou (vi) iliquidez ou difícil realização do ativo remanescente na instituição, reconhecidas pelo Banco Central. Ainda poderá ser encerada pela decretação da falência da instituição financeira.  

GARANTIA DO FGC 

O Fundo Garantidor de Créditos é uma associação civil sem fins lucrativos cuja finalidade é proteger depositantes e investidores no âmbito do Sistema Financeiro Nacional, atuando, também, na preservação da estabilidade do sistema e na prevenção de crises bancárias de caráter sistêmico. Na prática, o FGC funciona como um mecanismo de seguro destinado a mitigar os impactos econômicos decorrentes da insolvência de instituições financeiras, reforçando a confiança do público no sistema bancário brasileiro. 

Nos termos de seu Regulamento, o FGC garante os seguintes instrumentos financeiros: (i) depósitos à vista ou sacáveis mediante aviso prévio; (ii) depósitos de poupança; (iii) depósitos a prazo, com ou sem emissão de certificado (CDB/RDB); (iv) depósitos mantidos em contas não movimentáveis por cheque, destinadas ao registro de pagamentos de salários, aposentadorias, pensões e similares; (v) letras de câmbio; (vi) letras hipotecárias; (vii) letras de crédito imobiliário (LCI); (viii) letras de crédito do agronegócio (LCA); (ix) letras de crédito do desenvolvimento; e (x) operações compromissadas que tenham por objeto títulos emitidos, após 8 de março de 2012, por empresa ligada. 

A proteção oferecida pelo fundo é limitada a R$ 250 mil por CPF ou CNPJ, por instituição ou conglomerado financeiro, observando-se o limite global de R$ 1 milhão a cada período de quatro anos, independentemente da quantidade de produtos ou contas que o investidor possua na instituição. 

No caso do Banco Master, estima-se que aproximadamente R$ 62,2 bilhões correspondem a depósitos elegíveis à cobertura do FGC8 — valor que representa a maior operação de garantia já conduzida pelo fundo e evidencia a dimensão do impacto da liquidação extrajudicial sobre o mercado e sobre os investidores. 

IMPACTOS SISTÊMICOS 

Para o mercado, uma liquidação como a do caso do Banco Master não produz efeitos isolados. Isto porque, considerando a política agressiva de captação utilizada pela instituição, que oferecia taxas significativamente acima da média de mercado, a sua queda impõe um teste de estresse à credibilidade do segmento de bancos médios (Middle market).  

Neste cenário, é observado o fenômeno denominado flight to quality (voo para qualidade), movimento no qual investidores passam a retirar seus recursos de instituições de menor porte, vistas agora como de maior risco, e os realocam em grandes conglomerados bancários (considerados “too big to fail”, ou seja, grandes demais para quebrar), ainda que a taxas de remuneração consideravelmente inferiores9 

Esse cenário tem como consequência o desencadeamento de um endurecimento regulatório por parte do Conselho Monetário Nacional, visando coibir práticas de concorrência predatório baseadas em taxas insustentáveis, o que por consequência aumenta o custo de capitação de outras instituições Middle market que, indiretamente, sofrem com a desconfiança gerada pelo caso Master e a Operação Compliance Zero. 

CONCLUSÃO 

A liquidação extrajudicial do Banco Master S.A. constitui um marco na história recente do SFN, não apenas pelo volume inédito de ativos envolvidos e pela exposição recorde do FGC, mas também pela natureza das infrações que motivaram a intervenção. O presente caso expõe as fragilidades de um modelo de expansão fundamentado em alavancagem excessiva e captação a custos incompatíveis com a realidade de mercado, agravado por falhas graves de governança corporativa e compliance. 

Por sua vez, a liquidação do Banco Master também inaugura um período de intensa atividade contenciosa, visto que de um lado, inicia-se o desafio administrativo de processar a verificação de créditos e a realização de ativos em um cenário de fraude contábil; de outro, inicia-se também a batalha judicial pela responsabilização dos controladores e dos administradores, cujos desdobramentos na Operação “Compliance Zero” certamente influenciarão a recuperação de ativos na esfera cível. 

Contudo, o episódio serve como um alerta regulatório, pois embora os mecanismos de proteção sistêmica, como o FGC e a atuação do Banco Central, tenham funcionado para prevenir o risco de quebra em cadeia, o presente caso reforça a necessidade de um monitoramento preventivo mais rigoroso sobre instituições que apresentam crescimento patrimonial desconectado dos fundamentos macroeconômicos, de moda a garantir que a solidez do mercado não seja comprometida por aventuras gerenciais. 

 

Referências

1 AMARO, Mariana. Banco Master: qual é a história da instituição financeira? Infomoney, 2025. Acesso em: 20 nov. 2025. Disponível em: https://www.infomoney.com.br/business/banco-master-qual-e-a-historia-da-instituicao-financeira/ 

2 Op cit. 

3 COLAÇO, Janize; SANTOS, Micaela. CDBs irreais e carteiras de crédito falsas: entenda o que está por trás da liquidação do Banco Master. G1, 2025. Acesso em: 20 nov. 2025. Disponível em: https://g1.globo.com/economia/noticia/2025/11/18/entenda-o-que-esta-por-tras-da-liquidacao-do-banco-master.ghtml 

4 Op. cit. 

5 Op. cit. 

6 Op. cit. 

7 Agência O Globo. Banco Master: intervenção na instituição é a maior do sistema financeiro brasileiro. Infomoney, 2025. Acesso em: 20 nov. 2025. Disponível em: https://www.infomoney.com.br/mercados/banco-master-intervencao-na-instituicao-e-a-maior-do-sistema-financeiro-brasileiro/ 

8 Op. cit. 

9 GARCIA, Márcio; TRISTÃO, Tiago. Ciclicidade da alavancagem do sistema financeiro brasileiro. São Paulo: FEBRABAN – Diretoria de Regulação Prudencial, Riscos e Economia, 2016. Acesso em: 22 nov. 2025. Disponível em: https://cmsarquivos.febraban.org.br/Arquivos/documentos 

/PDF/Paper %201%20-%20PUCRio_2016.pdf 

Equipe relacionada

João Vitor Calabuig Chapina Ohara

Matheus Melo Eschipio

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Matheus Melo Eschipio